Homens em Crise: fenômenos presentes no sofrimento masculino
- Tiago Henrique Oliveira Lima
- 24 de fev.
- 5 min de leitura
Atualizado: 3 de abr.

Meu consultório e minha prática clínica despertam em mim o desejo de falar mais sobre o universo masculino e evidenciar as fragilidades que nele habitam. Desde meu primeiro ano como psicólogo clínico, em meados de 2014, o tema homem e suas masculinidades se encontra, naturalmente, direta ou indiretamente, presentes nas tramas e dramas narrados dentro do setting psicoterapêutico. As fragilidades e imaturidades masculinas se revelam nas falas, marcadas por sofrimento e dor, tanto dos próprios homens, quanto das mulheres afetadas por relacionamentos tóxicos com namorados, maridos, pais, chefes ou colegas de trabalho.
Senti na pele como pode ser violento o movimento de busca por crescimento, amadurecimento e responsabilização. Como homem, foi-me muito difícil e doloroso a busca por cuidado emocional e autoconhecimento. Lembro-me do constrangimento que sentia apenas por imaginar compartilhar minhas dores e vivências mais profundas. Ainda é claro em minha memória como quando adolescente experimentava altos níveis de ansiedade por causa das tensões que sofria vindas de uma pressão externa para me mostrar bem, forte, viril, capaz, inteligente, livre de inseguranças e incertezas sobre o mundo ou sobre de fato quem eu era. E isso se perdurou até um bom período da vida adulta. Na verdade, por tempo demais.
O público masculino, em sua grande maioria, procura meu consultório quando já está experienciando crises gravíssimas de ansiedade, ou já se encontram em estados profundos de depressão, ou quadros de isolamento, abuso de substâncias ou deterioramento dos relacionamentos familiares ou conjugais. É muito comum em homens casados, por exemplo, buscarem a ajuda psicológica quando sofrem um “ultimato” de seus cônjuges. Inclusive, é muito frequente que o primeiro contato tenha sido realizado pelas namoradas ou esposas, evidenciando ainda mais a dificuldade dos companheiros em se cuidarem. Ou seja, os homens têm extrema dificuldade em reconhecerem suas fragilidades e a buscarem por apoio profissional e o fazem quando já se encontram em profundo estado de desespero ou adoecimento.
A hegemonia dos padrões sociais de masculinidade prejudica o desenvolvimento de uma expressão autêntica do ser, o que intensifica os conflitos internos e contribui para o adoecimento mental. Em outras palavras, essa normatividade do que é ser homem produz uma pressão esmagadora sobre os ombros daqueles que estão em processo de construção de si, interferindo na exploração das possibilidades que os cercam para encontrarem um estilo pessoal e uma forma de existir que faça sentido e traga plenitude. E o que tenho testemunhado são ombros que, mesmo com a maturidade do envelhecer, continuam tensos e contraídos. Machucados e cansados de sustentar ideias e crenças rígidas, revelam um mundo interno duro e caótico.
Gostaria de compartilhar alguns fenômenos frequentes que observo na clínica. Antes, ressalto que meu objetivo é dividir essas percepções com empatia pelo sofrimento que afeta os homens e as pessoas ao seu redor. A intenção aqui não é confrontar, desrespeitar ou diminuir as dores do universo masculino, mas sim destacar como essas barreiras fazem parte do caminho para o desenvolvimento da maturidade emocional e da autenticidade, encorajando a busca por mais conexão consigo mesmos.
Um fenômeno muito comum entre os homens é o repertório emocional limitado, que dificulta a identificação e regulação das próprias emoções. Além disso, muitos sentem estranheza e fragilidade ao lidar com sentimentos considerados negativos, como tristeza, ciúme, insegurança, nojo, medo e decepção. Quando não conseguimos nomear nossa experiência interna, a frustração e o tensionamento surgem. O que tenho aprendido é que, diante dessas tensões, muitos homens expressam-se por meio da raiva, frequentemente de forma agressiva e violenta. A raiva, muitas vezes, camufla sentimentos vistos como inaceitáveis, pois a sociedade ensinou que nos tornariam fracos ou "menos homens".
Acima, podemos perceber como a limitação do repertório emocional, a dificuldade de lidar com emoções tidas como negativas e a tendência de expressar tensões por meio da raiva estão profundamente interligadas. Esses fenômenos refletem um modelo de masculinidade que restringe a vivência plena das emoções, levando muitos homens a sufocar suas fragilidades e a manifestá-las de forma agressiva, em vez de acolhê-las e compreendê-las.
Quando ocorre na dinâmica da experiência interna emoções e sentimentos que são difíceis de serem nomeados e sentidos integralmente se desencadeia fortes tensões internas. Fazendo-se, assim, muito comum outro fenômeno no masculino que é a utilização de comportamentos de fuga e mecanismos de defesa como o uso de substâncias, sejam elas lícitas ou ilícitas, comportamentos compulsivos relacionadas à pornografia, jogos, telas em geral e até excesso de trabalho. Essas são formas não conscientes de evitar o enfrentamento das emoções mais dolorosas ou das angústias existenciais.
A ansiedade de performance é outro fenômeno profundamente enraizado no sofrimento masculino. É fortemente impulsionado pelas expectativas sociais que exigem do homem uma constante demonstração de força, de competência, de sucesso. Somos pressionados a nos destacarmos no trabalho, nas relações interpessoais e também no sexo. Desse fenômeno surge uma terrível carga emocional que se manifesta como medo de falhar, insegurança, ciúme doentio, baixa autoestima e autocobrança excessiva. Quando não reconhecida e bem compreendida, essa ansiedade leva a sérios quadros psicológicos e psiquiátricos como impotência sexual, estresse crônico, transtornos ansiosos como síndrome de pânico, TAG, TOC, além de depressão e outros quadros graves.
A psicoterapia é um espaço no qual os homens têm a possibilidade de explorarem seus conteúdos emocionais e desenvolverem habilidades para lidarem de maneira mais assertiva com seus conflitos internos, com a raiva, com o estresse e se tornarem pessoas mais inteiras. O contato terapêutico consigo mesmo auxilia no melhoramento das relações interpessoais à medida que fortalece a autenticidade de sua expressão no mundo e amplia o repertório emocional.
Além disso, o processo psicoterapêutico os ajuda a enfrentar outros fenômenos comumente presentes na masculinidade, como o isolamento e a solidão, a dificuldade em pedir ajuda e os dilemas para vivenciar uma paternidade emocionalmente presente. Com o tempo, aprendem a se abrir para o apoio de outras pessoas, a construir relações mais significativas e a viver sua masculinidade de maneira mais livre e autêntica.
Embora desafiador, o manejo clínico tem se mostrado uma ferramenta poderosa na promoção da saúde mental desses homens. Percebo como a psicoterapia tem auxiliado meus clientes a expandir seu vocabulário emocional, a reconhecer e regular suas emoções mais habilidosamente, a se responsabilizarem pelos seus afetos, a se permitirem vivenciar suas vulnerabilidades, a manifestar suas fragilidades e, dessa maneira, a estabelecer conexões mais genuínas. Dessa forma, tornam-se mais aptos a expressar suas necessidades de um jeito saudável e a lidar com conflitos sem recorrer à agressividade ou ao isolamento.
E qual é a fórmula da psicoterapia? Em quanto tempo atingimos os resultados esperados? Como psicoterapeuta da abordagem humanista-existencial fenomenológica, acredito que cada homem traz consigo uma história única, e meu papel é caminhar ao seu lado, sem tirar o poder que você tem sobre si mesmo. Por isso, não há uma fórmula pronta, e eu não me sinto no direito de determinar sozinho quantas sessões precisará para se sentir melhor. O que faço é caminhar com você, revisando o processo com certa frequência, para que possamos analisar os resultados já alcançados e os caminhos que ainda deseja percorrer.
Muitos homens relatam sentir um alívio significativo já nas primeiras sessões, ao encontrarem um espaço seguro para compartilhar suas dores e refletir sobre seus desafios. Outros, que inicialmente têm mais resistência, levam um pouco mais de tempo para perceber os avanços. Alguns ficam meses, outros anos, e há aqueles que não retornam. Esforço-me para ser o mais presente possível em cada encontro, lançando-me inteiramente na relação. Gosto de pensar que, juntos, criamos um espaço seguro, exclusivo e personalizado, onde cada cliente pode encontrar seus caminhos de superação e crescimento pessoal.
Conte comigo em seu processo de cuidado e prevenção relativos à saúde mental.
Tiago Henrique.
Comments